19 março 2009

o que te quero dizer sobre o peso no peito

Gosto de te ouvir quando falas baixinho e de saber acabar as tuas frases. Escrever-te é conversar contigo em silêncio. Há noites em que tenho muitas coisas para te dizer – para contar ou perguntar ou só para nos rirmos um bocadinho juntos. Quando te ris acredito mais na vida, fica tudo bem, está tudo bem, somos só felizes. Um dia vou fazer marcas de furador em folhas e entregar-te esta vida feita de letras. É nossa e tu não sabes que existe. O meu sonho era escrever letras destas todos os dias mas, sabes, este também me deixa um peso no peito. Não deixa todos os dias, mas não tenho a chave desta porta. Por isso não cheguei a entrar. E do lado de lá não corri o mundo por um sonho, não dormi menos por um projecto, não passei noites em branco por um prazo e não me esqueci de comer por uma ideia genial que tinha de ganhar forma. Há muitas pedras que não são só pedaços mais ou menos recortados de rocha. Damos vida ao que quisermos e somos muito mais do que hoje, depois destes anos todos. É verdade, juro que sei que somos. Já não lemos histórias na cama mas lembro-me de o termos feito. Lemos uma inteira, muito inventada, quando parti a cabeça no baloiço da ilha do Farol, naquela casa pequena e velha ao pé da torre do farol e do mar. Já comemos toranjas azedas com açúcar e pêra abacate porque sabia a Paris e tu gostas muito de Paris. Já não marcamos férias juntos, mas conhecemos muitas ruas mais antigas que nós e demos muitos mergulhos de mar e rio com sabor a granizado de limão e em todos os sítios que vou lembro-me de ti. Levamos connosco o que é nosso, e o que é nosso nem sempre é agora. Faz uma lista de ti, mais ou menos desorganizada. Experimenta. Olha para trás só mais uma vez antes de olhares para a frente e lembra-te de tudo. Sabes quem és? Não marcaste no chão as curvas exactas por onde vais? Perfeito. Vou sorrir contigo quando fecharmos essa porta.

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