25 abril 2009

Se tivesse o coração partido contava às vozes do meu telefone como me doía, como não estava à espera, como nunca pensei que ele fosse assim, debitava as juras de amor que me tinha feito poucos dias antes e limpava as lágrimas em papel próprio para amor magoado. Se tivesse o coração partido, sabia que músicas ouvir para me explicarem as histórias de amor que acabam, horas inteiras em que a música fugia do rádio e eu fugia de mim. Se tivesse o coração partido sabia exactamente quem me ia entregar as colinas de dia, o rio de noite e um abraço apertado numa viagem pela madrugada para me dizer que o mundo continuava o mesmo. Era ter o coração partido ou a começar a dar de si e sabia o que fazer até me esquecer do sítio onde o tinha deixado cair. Para o coração partido estava preparada - comprava um L&M azul e curava-o com cigarros que o meu corpo já não pedia mas que eu sabia que faziam parte dos desgostos de amor porque é isso que vejo no cinema. Havia teses de milhares de folhas, filmes a preto e branco e vozes que cantam baixinho há muitos anos para confortar esse amor magoado. Contra esse coração partido escrevia o que sentia em todo o lado e a toda a hora, tinha a cabeça concentrada numa lista de supermercado para me comprar projectos, ideias, músicas, livros com cheiro de vidas novas, pós-graduações, viagens e rituais no corredor dos frescos. Para um coração partido eu tinha a solução. Um coração partido eu sabia curar devagarinho. Mas a este coração que não me ouve e a quem eu não dou autoridade não sei o que fazer.

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