Imagino-me de ténis e jeans aos pulos, o cabelo apanhado num rabo-de-cavalo, a cantar de olhos fechados, um braço no ar, esticado, os dedos a apontar para cima, só para cima, no escuro que é meu e as músicas-do-coração a contagiar, a subir, a ganhar-me, gritadas de olhos cúmplices até eu ser aquilo - ser o som, o fumo que queria, o barulho em que não me ouço, os olhos em que podia ter-me visto reflectida, teus. Velocidade é isto. O ritmo acelerado, concertado, alinhado. Um cigarro ou outro, fumado devagar, len-ta-men-te, como um doce que persiste para lá da boca porque não quero que acabe. Água fresca. Os pés que saltam, mergulham, devoram e já não tocam no chão, perdem o norte do soalho, da alcatifa, do gesso metálico do tecto com luzes e estruturas labirínticas e muitos muitos andares, como o Céu. És cima ou baixo? Calor no pescoço. Tenho calor no pescoço e nos ombros. Peço-te em sopro. Dás-me um sorriso que rasga e não dói. Sabes do que falo. Sentes o mesmo e sentes-me assim. Não preciso de procurar-te quando sei exactamente onde te guardas e conto de cor os segundos que faltam para a hora prevista da explosão, a conta-gotas, em bomba-relógio, aquela que me prometeste. Abro os olhos para as mãos dadas, os corpos com ritmo de há 20 anos nos corpos em êxtase que não têm mais de 20 segundos de passado. Também estás quente. Está quente, aqui. Ca-lor. Pergunto-te e não quero resposta, não respondas enquanto te absorvo, não uses as palavras quando eu só quero respirar-te. Fica só aqui, só por agora, só um bocadinho, depois logo se vê.