aprendi-te o Mia Couto em duas frases. porque ele tinha asas e eu não sabia usar as minhas e os teus anos já te tinham ensinado que querias voar. depois demorei três anos a encontrar um besouro entre os meus livros. e quando o vi parei. reconheci-o nas letras pequenas - um besouro é uma pequena coisa? - e quando o vi parei e o coração lembrou-se. sorriso fundo profundo e um suspiro. risco por baixo e mais um traço largo e torto de cada lado, uma linha recta que é só curva, e uma curva já mais direita, mais composta, mais com alma de paralela marca o 139 para o besouro não me perder longe da eternidade deste bico mole de carvão. ouve-se o fado do outro quarto. uma guitarra canta e pergunta o o que foi que aconteceu mas não aconteceu nada, já tinha acontecido. arrisco um desaconteceu, se me permitires a liberdade e entenderes estas palavras. e no calor deste quarto fecho o livro nas mãos e escrevo-lhe o prefácio. a palavra prefácio depois da palavra romance e eu já noutra página. um livro escolhido quase ao acaso, ainda que me tenha sabido a ti quando lhe peguei, e eu de volta à tua história com o gesto doce de quem agora a sabe ler. acabo assim o teu recomeço. tu sempre foste um livro.